Judiação


Como diz o Millor, quem é vivo sempre desaparece. Não vou nem me perdoar. Nem me desculpar. O mundo veio acima. Caí de joelhos. E os ossos, doem! Doem ossos para o Enrico!

Sabem qual o país que eu mais desejei visitar na vida? Espanha. Pois recebi um convite para cobrir um evento na Espanha, sou jornalista, caso alguém tenha preguiça de ler o blog inteiro para entender a frase. E fiquei 24h em pane, sem falar nem para Tata, porque achei que estava recebendo um presente dos céus… E que talvez alguém lá em cima, que bobagem, estivesse me presenteando com tudo que eu queria em vida para terminar de uma vez com minha existência. Isso porque dias atrás tinha aparecido a oportunidade de assinar uma coluna semanal de página inteira em um jornal local de grande circulação, da área de economia, centenário, uma honra, enfim, que eu topei, obviamente, e que, profissionalmente, significa um segundo patamar, um novo nível, já que até então eu militava na imprensa digital, algo ainda um tanto, digamos, alternativo. Então, como estava dizendo, 24 horas depois, eu tive coragem e contei pra Tata e depois fui contando pras outras pessoas. Liguei pra agência de viagens responsável, comecei a correr atrás da papelada. Decidimos que iríamos juntos, depois passaríamos em Paris, o lugar que tanto minha querida sempre sonhou em me levar. Ela já esteve lá e acha que eu iria adorar Mont Martre. Iríamos juntos por isso, mas também porque nem Tata nem eu conseguimos mais nos imaginar com um oceâno de distância. Não só pelo amor, mas também porque não saberíamos o que fazer se acontecesse algo comigo de uma hora pra outra e não tivessemos o apoio mútuo que acostumamos a nos dar. E se eu fosse hospitalizado por um motivo ou outro? O que faria eu sem Tata? Como Tata reagiria sabendo disso no Brasil?

Dois ou três dias depois a gente teve uma pequena idéia do que seria. Interferência divina de novo? Quatro horas de dor calcinante, ininterrupta, acachapante, supostamente, na hora, definitiva, como se houvesse algo definitivo na vida. E dê-lhe medicação disponível, desespero, rolando no chão, gemendo, sem ar, sem saliva, eventuais gritos, discussões, sussurros de “meu amor”, “vou morrer”, “eu que deveria estar sentindo isso”, “meu Deeeeus”, “que horroor”, “me leva, me leva”, “não aguento mais, por favor”, “vamos pro hospital”, “Nãoo, Nãooo”. Fomos. Lá, na emergência, depois de uma série de exames, ficou constatado que o ´nível das plaquetas do meu sanguinho era tão baixo que se eu caísse, tivesse algum pequeno sangramento interno, isso causaria um dano fatal, porque meu sangue simplesmente não coagularia, eu teria hemorragia interna e provavelmente morreria. Então, amigos, foi recomendado que eu deveria ser internado! Sim, internado. Pra mostrar bem os riscos de uma viagem pra Espanha, não esqueçam…

Trocamos de hospital, porque aquele a gente estava usufruindo apenas para casos de emergência, afinal é o mais perto de nossa mansão. O que confiávamos, ficava perto do nosso antigo apêzinho, aquele onde a nossa vida não tinha qualquer glamour, mas ao menos era eterna. Chegamos lá e fomos para a emergência, porque não havia quarto disponível, não havia quarto disponível. , não havia quarto disponível, não havia quarto disponível, não havia quarto disponível, não havia quarto disponível, não havia quarto disponível, não havia quarto disponível, não havia quarto disponível, não havia quarto disponível, não havia quarto disponível, não havia quarto disponível, não havia quarto disponível, não havia quarto disponível, não havia quarto disponível, não havia quarto disponível, não havia quarto disponível, não havia quarto disponível, não havia quarto disponível, não havia quarto disponível, não havia quarto disponível, não havia quarto disponível, não havia quarto disponível, não havia quarto disponível, não havia quarto disponível. E foi mais ou menos esse o número de vezes que ouvimos de enfermeiras, chefes de enfermagem, médicos, auxiliares administrativos, sei lá mais quem. O quarto era minúsculo, sem banheiro, e eu – imunodepressivo – sem poder sair de lá, com dificuldade para ir aos pés, quiçá para ir a cura, caguei durante dois dias num troninho parecido com uma cadeira de rodas, porque, sim, porque por dois dias, argumentaram que não havia quarto disponível. A coisa foi ficando insuportável, fui perdendo a razão, Tata o controle, eu também, a família sem saber o que fazer, de repente uma discussão irrompe, interrompe a civilidade com que haviamos tratato o tratamento que nos davam e daí comentei com Tata que ela devia fazer plantão na área administrativa para conseguir um quarto, ela – claro – não aceitou a tese, que considerou como crítica; “Afinal, estava ali cuidando de mim”. Liguei então para Geisel, botei a boca nele, dizendo que deveria estar lá resolvendo isso, que eu não suportava mais defecar no próprio quarto, o que diabos ele estava fazendo em casa se eu estava naquele estado! E mandei tudo à merda também e comecei a berrar por socorro, que eu exigia um quarto decente, que não merecia cagar na frente da minha família, que aquilo era uma pocilga, que eu não era um PACIENTE, que eu era um CLIENTE! Eis que a enfermeira adentra o quarto, “mas o que houve?” “Houve que eu quero alguém da administração aqui em 15 minutos ou vou-me embora e se cair aqui dentro deste dito hospital processo vcs por maus tratos!” “Calma, senhor, já vem alguém aqui” E eu segui urrando e berrando e de certa forma me dando conta de que a partir de um determinado ponto eu já estava fazendo teatro, porque já sentia que a gritaria toda tinha efeito, mas não podia parar mais afim de que algum efeito positivo tivesse e tudo indicava que ia ter mesmo, até que alguém realmente veio e em 15 minutos Geisel apareceu, chegou a sorrir, porque eu já estava numa maca de rodinhas, sendo levado por cinco enfermeiras para um quarto amplo, com vista para o Rio Guaíba, banheiro impecável, cama para acompanhante, sala de estar, tv a cabo, um hotel cinco estrelas, enfim. Mazéin? Fiquei cinco dias por lá e continuei com dificuldade para defecar e com dores horríveis e com baixas plaquetas, mas tomando morfina, que não é grande coisa dependendo da enfeirma que a aplica. Se no final não for dado um jato mais fortinho via ampola ela tem pouca graça. Por outro lado, se entrar com mais força no final o mundo fica lindo e maravilhoso por alguns minutos. E se vc dormir logo em seguida nem se importaria se na verdade fosse a morte.

BLOGGER

Trópico de Câncer
Comentários do post 37461110
oi, mano depois de muito tempo estou aqui novamente. Como zelda também ando silenciosa. Mas, meus pensamentos estão sempre voltados para vocês. Tenho notícias todos os dias pela mamy. Amanhã estarei indo pra capital federal, a trabalho, espero que fiques bem e mantenhas o ânimo e a força de sempre. Estás nos dando um belo exemplo de luta por teus sonhos. Na verdade vocês dois. Ficarei com o pensamento aqui no sul. Fiquem bem. Um abraço bem apertado. Manterei contato. Mana zele. zele | 09-10-2005 23:20:53
Estamos ai companheiro. E se passar por Barcelona, vai tomar um café com meu irmão!! Saudades. Cozinheiro Cozinheiro | 09-10-2005 22:36:17
Mano, fico feliz que tenhas retomado o blog. Teus leitores já estavam clamando por notícias. Tenho estado silenciosa, nesta semana fiz provas de proficiência em frances e espanhol. Acho que passei... fiquei bastante envolvida com isso! Mãe falou-me que voces tinham programação com os tios hoje. Foram? Tenho tido noticias de vocês pela mãe que também está na luta e bem barrigudinha. Vamos organizar um encontro pra assistir um bom filme no telão. Super beijo para os dois. Com muito amor da Zelda Zelda | 09-10-2005 22:03:37
mas muito bem. Gostei da atitude desaforenta. Viva! Vivas! Sem entender do riscado, adorei te ver na página do jornal. E eu que odiava tachar o dito!!! Olha aqui, quando vão às touradas em Madrid? Et sur le ciel de Paris? Dou força. Vais, SIM, realizar tu sueño e o da Tata. prometes? Meu beijo e toda a força do mundo. Ritinha | Email | 09-10-2005 18:41:20
Droga, eu passei por isso tudo e sei como em determinados momentos só o fiasco resolve. As pessoas num hospital vão ficando amortecidas e muitas vezes só o grito as faz tomarem providências. Minha experiência é de estar no lugar da Tata, cuidando. Só que eu gritava sozinha, já que o paciente era um tanto mais comportado, com certeza. Eu queria te fazer uma visita ainda antes de Sacre Coer... Beijos. Obrigada por dar notícias. Claude. Claude | Email | 09-10-2005 12:23:30
Pois eu sou um dos cunhados. Lembro da brincadeir que se cunhado fosse bom não começava com as duas letras que começa,.... Novamente na luta, agora com página em jornal centenário, telão para assistir o colorado (bem que podia ser gremista né?), paparicado por todos nós, uns em silêncio obsequioso, outros aos gritos. Grito por grito tu gritas mais que todos nós juntos (sempre foi). Vamos lá, Sacre Coer te aguarda. J JJ | Email | 08-10-2005 22:11:16